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Procurador-geral do Trabalho: denúncias de assédio eleitoral, como demissões, ainda serão recebidas e investigadas

10/11/2022, às 08:17:41
Mesmo com o fim do processo eleitoral, o Ministério Público do Trabalho continua recebendo denúncias, inclusive de retaliações

  
'A resposta do Estado tem de estar à altura do ilícito. A maior campanha que podemos fazer é que não tenha sensação de impunidade', afirma o procurador-geral - Foto: Divulgação


por Vitor Nuzzi


Foram 2.838 denúncias envolvendo 2.137 empregadores, 77 ações civis públicas, 243 termos de ajuste de conduta (TACs) e 1.318 recomendações. Os números atualizados do Ministério Público do Trabalho mostram que o chamado assédio eleitoral foi uma prática recorrente neste ano, com 13 vezes mais denúncias do que em 2018, por exemplo. Mesmo passadas as eleições, os casos continuam chegando ao MPT. Agora, envolvem participação forçada de trabalhadores em protestos e até demissões.

Por isso, as investigações prosseguem, afirma o procurador-geral do Trabalho, José de Lima Ramos Pereira, no MPT desde 1993. Ele conta nunca ter visto tamanho volume de episódios de assédio eleitoral, muito inusitados. Como o caso do celular no sutiã, outro na região Sul em que o empregador exigia “comprovante de ausência” do empregado na eleição e ainda um em que o patrão determinou que o funcionário levasse dois celulares – um para deixar com o mesário e outro para documentar seu voto no candidato indicado.


Limites éticos


São apenas alguns casos emblemáticos, que refletem uma aguda polarização política que contaminou o ambiente de trabalho. E que acaba impondo a lei do mais forte – no caso, o empregador impondo preferências políticas, por ameaça, chantagem ou benefício. Por outro lado, o grande número de casos que chega ao MPT mostra que as pessoas conhecem seus direitos e sabem a quem apelar. Muitas vezes, avalia, o patrão sabe que está errado, mas não se importa em “ultrapassar os limites éticos do contrato de trabalho”.

O procurador-geral acredita que, apesar do ambiente, uma rediscussão da Lei 13.467, da “reforma” trabalhista, pode ser viável, desde que haja vontade das partes de dialogar e realizar uma efetiva negociação. O que não aconteceu em 2017, embora ele não considere que as mudanças foram impostas. “Houve um processo legislativo, uma discussão interna, foi legítimo. Tem que trazer a sociedade para discutir. Eu diria que faltou um debate maior.”


Confira, a seguir, a íntegra da entrevista:


Era de se esperar um crescimento do número de casos, mas certamente não nessa proporção. A política contaminou o ambiente de trabalho?

A polarização política contaminou as relações sociais, dentro de casa, familiares, ambientes de amigos e também se estendeu para a relação de trabalho. Esse é o problema. Quando você tem dois amigos conversando, estão em igualdade de condições. Mas quando você tem um empregador que tem o poder diretivo e o empregado que depende do emprego, é diferente. A relação e trabalho não tem  nada que vincule à opção do voto, que pela Constituição é livre e secreto.

Portanto, qualquer interferência, seja para coagir, seja para prometer um benefício pro empregador votar em alguém da preferência do empregador, é ilícito trabalhista e tem que ser combatido.

Qualquer interferência, depois da eleição, para que esse mesmo empregado ou outro empregado sejam obrigados a participar de manifestações políticas, é um ilícito trabalhista. Qualquer interferência também em relação a inclusive despedir por opinião política diferente é uma discriminação. Tudo isso tem que ser investigado e está sendo investigado.



Já chegaram, então, informações sobre dispensa de trabalhadores?

Já houve informação, não tenho como quantificar agora, porque tudo esta sendo recebido no nível de assédio eleitoral. Mas já tem informações, sim, de coações de empregados para participar de manifestação, já temos denúncia de dispensa discriminatória de empregado por opinião política diferente. Isso já está seno analisado e investigado na instituição.


A que o sr. atribui essa possível banalização de ocorrências? Impunidade, falta de conhecimento sobre a lei ou má-fé mesmo?

Eu diria que é uma soma de vários fatores. A ciência da população de que ela tem direito a votar em quem quiser. A consciência de que esse direito, ao ser violado, o cidadão, cidadã pode procurar instituições para que isso não ocorra, ou para que pelo menos combata, como é o caso do Ministério Público do Trabalho. A polarização política muito forte em todo o país, a banalização do ilícito, como você bem falou, o empregador pode estar pensando que está fazendo algo que seja normal, ajudando alguém, e também ele pode pensar que tem certeza que é errado, mas não tem importância, a vontade de buscar que o seu candidato preferido ganhe a eleição pode ultrapassar os limites éticos do contrato de trabalho. E não pode.


O que pode ser feito para ao menos reduzir a incidência de casos? As punições são suficientes?

A resposta do Estado tem que estar à altura do ilícito. Se não responder – quando eu falo Estado é Ministério Público, Poder Judiciário, em todas as esferas –, se não responder, se entender que não vai ter nenhuma decorrência, não tenha dúvida de que isso será um estímulo. Que não vai haver, não está havendo. O MPT está participando ativamente contra qualquer ato desses dentro da relação do trabalho. O que não é dentro da relação de trabalho o MPT encaminha ao Ministério Público Eleitoral, ao Ministério Público Federal, para que se apure o crime respectivo.


Como o sr. falou no início, é uma relação desigual. Em geral são os trabalhadores de menor renda, de menor proteção, que são os mais atingidos?

Há uma abrangência que envolve empresas grandes, pequenas, médias, envolve sindicatos, tem denúncia de cooperativas. As denúncias são variadas. Mas não tenha dúvida de que hoje aquele trabalhador mais vulnerável socialmente fica sendo objeto de maior incidência desse assédio eleitoral.


Nós vamos entrar em outro governo, e já se discute não digo uma revogação, mas uma revisão da “reforma” trabalhista de 2017, sobre a qual inclusive o Ministério Público tem uma visão crítica. O fato de termos esse clima ainda tão acirrado não pode prejudicar uma discussão que fatalmente vai acontecer?

As reformas existentes em 2017 tiveram como modelo a mesma reforma que foi feita na Espanha. E agora, recentemente, a Espanha reformou a reforma. Eu acredito que, diferentemente da reforma de 2017, qualquer alteração a ser feito agora tem que haver um debate, amplo, com toda a sociedade. Isso é importante. 

Todas as situações da reforma trabalhista não podem ser consideradas 100% de um lado péssimo ou ótimo. Temos que analisar o que foi bom, o que não foi bom, o que teve boa repercussão ou não teve, no ambiente de trabalho. O que o MPT não concorda é perda de direitos, isso independe de quem vai fazer, qual governo vai fazer. 

A necessidade maior do que falar em reforma da reforma, revogação da reforma, é maior debate sobre alguma reforma que possa ocorrer na área trabalhista. Precisa de debate. Diálogo social. Ouvir os três lados envolvidos, empresas, empregados e Estado, através das instituições. Mas não é questão de clima ou não clima. É questão de oportunidade de discussão, desde que tenha um diálogo maior.



Daqui para a frente, enquanto as investigações de assédio eleitoral ocorrem, o Ministério Público – que inclusive elaborou nota técnica durante o processo eleitoral – pretende ampliar essa tentativa de esclarecimento principalmente junto aos empregadores, para que não tenha repetição desses casos, ou pelo menos nessa amplitude como verificamos na eleição este ano?

A maior campanha que podemos fazer é atuarmos e dar resposta, com ações civis públicas, termos de ajuste de conduta, recomendações. Efetivamente buscar que aquele responsável se retrate, aquela pessoa responsável pelo ilícito se retrate, que que ele pague pelo dano. Que tenha uma resposta especifica, determinada, condizente, com o ilícito praticado. A maior campanha que podemos fazer é que não tenha sensação de impunidade.




Fonte: Rede Brasil Atual - RBA
 
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